sábado, 1 de novembro de 2008

O uso dos antibióticos

Ao longo da minha carreira devo ter ouvido esta frase mais de mil vezes: ó doutor então e não me dá antibiótico? Não!
A resposta invariavelmente causa uma expressão de cepticismo medieval na face dos pacientes, tal habitual é o uso destes fármacos. Por isso mesmo, e porque geralmente os profissionais de saúde não querem confrontar esse cepticismo, com receio de serem considerados
maus doutores, é prescrito o antibiótico.

E o que faz esta droga, então? Duas coisas antagónicas:
1) mata/inibe reprodução das bactérias, diminundo o risco de infecção após intervenção dentária;
2) se usada descuidadamente, como é a maioria das vezes, acaba por não eliminar as bactérias todas, dando-lhes a possibilidade de se tornarem
resistentes ao medicamento.

Isto quer dizer, em termos muito práticos, que em Portugal aproximadamente
mais de 1/3 dos pacientes são resistentes aos antibióticos mais comuns, (isto é têm bactérias resistentes) ou seja, se um dia destes tiverem uma infecção mesmo séria, será bastante difícil combatê-la. Se compararmos esta percentagem com a da população do Reino Unido (cerca de 4% de resistências) iremos ficar bastante alarmados.

Claro que mesmo assim se torna sempre muito mais fácil para o dentista prescrever o antibiótico, mesmo sabendo que está a contribuir para este negro cenário pois evitará em princípio que o paciente desse modo:
1) fica mais confiante pois está a tomar antibiótico;
2) dá mais valor ao dentista pois
"aquela situação era complicada tive de tomar antibiótico e tudo!"
3) se eventualmente acabar por haver mesmo uma infecção, o paciente não vociferá
"e aquela besta nem sequer me deu antibiótico!"

Pacientes e colegas: com tratamentos conservadores, com cuidados devidos de assépsia e desinfecção, uso de dique de borracha, uso de materiais indicados para a situação, cuidados de higiene oral e de cumprimentos das indicações do dentista evitarão a necessidade de terapia antibacteriana coadjuvante em 99% dos casos.

DF

4 comentários:

Anónimo disse...

" mais de 1/3 dos pacientes são resistentes aos antibióticos mais comuns"
Um valor alarmante, confirmado por algum estudo?
Espero que não, um paciente com resistência a um antibiótico deve ser algo impossível, com sensibilidade/alergia acredito, agora resistência não acredito

DF disse...

Ao reler o texto com mais atenção aperceber-se-á de que tive o cuidado de explicar entre parêntisis que evidentemente as bactérias que afectam os pacientes é que são resistentes.
Bem sei que em Portugal não têm havido campanhas de sensibilização da comunidade médica como as há no Reino Unido e países nórdicos, mas espero que essa seja uma realidade muito próxima da nossa. Deixo-lhe documentação para espreitar:

http://www.fda.gov/Fdac/features/795_antibio.html
http://ideas.repec.org/p/rff/dpaper/dp-01-23.html
http://www.informaworld.com/smpp/content~content=a785590151~db=all

AMSA disse...

infelizmente as pessoas têm a idéia errada de que se não se receita antibiótico é porque foram "mal atendidos"

AMSA disse...

Concordo, mas é tão difícil passar esta mensagem!!